Ceará foi o 2º no Nordeste a criar mais vagas temporárias e intermitentes em 2021

Apesar do crescimento, as modalidades mais flexíveis não foram capazes de reverter os efeitos negativos da pandemia no mercado de trabalho

O Ceará foi o segundo estado do Nordeste a gerar mais empregos intermitentes e temporários nos primeiros quatro meses deste ano, com 698 e 156 vagas abertas, respectivamente. Foi o 9º melhor resultado no País, conforme dados do Ministério da Economia.

Apesar do resultado, a avaliação de especialistas é de que mesmo essas modalidades mais flexíveis de contratação não foram capazes de reverter os efeitos negativos da pandemia no mercado de trabalho.

Apenas um estado nordestino apresentou saldo negativo no primeiro quadrimestre de 2021, Alagoas (-59). O regime de trabalho intermitente entrou no escopo da Reforma Trabalhista, promulgada no governo Michel Temer (MDB), em 11 de novembro de 2017.

Com esse tipo de vínculo, o contratado não tem expediente definido, trabalha somente quando é chamado e recebe o pagamento de acordo com as horas trabalhadas. Não há, portanto, jornada mínima e salário fixos.

Em relação aos benefícios previdenciários, estão garantidos somente quando o trabalhador recebe a partir de um salário mínimo no mês. E não há opção de seguro-desemprego.

Já as férias (proporcionais) e repouso semanal remunerado estão garantidos. Outro ponto que o diferencia do modelo convencional é a possibilidade de o trabalhador atuar em mais de uma empresa.

Nesse contexto, quando a modalidade foi criada, acreditava-se que conseguiria reduzir a informalidade. Isso porque o relaxamento do vínculo formalizaria aqueles que vivem de ‘bicos’ e reduziria custos para as empresas.

Já o trabalhador temporário tem a jornada semelhante ao convencional, mas possui prazo para acabar a prestação do serviço. Esse o recurso é o mais utilizado em datas comemorativas para atender à alta demanda, como no fim do ano, por exemplo.

DEMANDA É RESIDUAL, MAS CRESCENTE

O analista do Instituto de Desenvolvimento do Trabalho (IDT/Sine), Erle Mesquita, explica que, embora tenha havido um crescimento durante a pandemia dessas modalidades de contratação, a demanda ainda é residual, representando apenas 1,2% do total das admissões que aconteceram em 2020.

“No Brasil, essa porcentagem é ainda menor: de apenas 1%. No entanto, o que temos visto é que há uma maior expansão para vários setores da economia mesmo tendo sido criado para algumas exceções, a exemplo do setor de eventos”, detalha.

Dados do IDT apontam que 349 dos 698 novos empregos foram de atividades administrativas, 180 da construção civil e 110 da indústria de transformação.

No Ceará, as ocupações que mais contrataram nessa modalidade foram: técnico de manutenção de edificações, faxineiros, montadores de máquinas, abatedores de carne e eletrotécnicos.

IMPACTOS DA PANDEMIA 

Segundo Mesquita, todo momento de crise acaba revisitando discussões sobre alterações no regime de contrato de trabalho.

No entanto, com a pandemia, o analista pontua que foi observado uma preferência dos empresários pelo regime padrão especialmente por conta das questões trabalhistas.

“A gente espera que essas modalidades continuem realmente sendo residuais, pois, na prática, acaba sendo ruim tanto para os trabalhadores como para os empresários”, argumenta o analista.

Mesquita destaca ainda que a alternativa é defendida por possibilitar que trabalhadores especializados possam vender seu serviço para várias empresas.

“O que vemos, no entanto, é uma de baratear e fragmentar a jornada dos trabalhadores, pois há uma incerteza muito grande sobre quanto o trabalhador vai ganhar na semana”.

ERLE MESQUITA
analista do Instituto de Desenvolvimento do Trabalho

“Essa legislação foi votada de forma muito rápida, não houve uma discussão ampla sobre isso. O problema, na verdade, é a forma como ela foi posta no Brasil, em muitos países há algumas limitações e, inclusive, muitos estão retrocedendo nesta decisão”, acrescenta.

CONTRATAÇÕES DURANTE A CRISE

Já para o advogado trabalhista e consultor jurídico da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Ceará (Fecomércio-CE), Eduardo Pragmácio, o trabalho intermitente pode tornar a contratação viável durante a crise.

“O intermitente é muito flexível, sobretudo, a essas incertezas e flexibilidades do comércio em geral”, avalia. Ele pondera, no entanto, que, apesar dos benefícios, poucos setores tiveram oportunidades de contratar.

Diante da situação, o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (BeM) teve medidas mais adotadas desde o início da pandemia.

“A impressão que nós temos é que os novos negócios, que abriram durante a pandemia, começaram a abrir se utilizando de mão de obra intermitente, mas quem tinha trabalhadores na modalidade convencional se utilizou da suspensão do contrato ou redução da jornada”, analisa.

EDUARDO PRAGMÁCIO
advogado trabalhista

O presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes no Ceará (Abrasel-CE), Taiene Righetto, acrescenta que esse tipo de vínculo “era promissor antes da pandemia”.

“Mas, agora, não há condição de contratação. Estamos muito restritos. A característica desse modelo é começo e fim, mas, neste caso, não sabemos quando vamos abrir e fechar”, aponta.

“Por isso, não dá para utilizá-lo, pois depende de planejamento e só temos imprevisibilidade agora”, complementa, reiterando que o programa de redução de jornadas foi o mais eficaz para o segmento.

Fonte: Diário do Nordeste