Segmento de luxo se consolida também para usados
Produtos da Cyrela com Armani e da Even com Faena chamam atenção, com reflexos no alto padrão de segunda mão
Um lançamento da Cyrela em parceria com o braço imobiliário do banco Safra em que brilhará o prometido maior edifício residencial de São Paulo chamou atenção para o segmento de luxo paulistano.
Sem surpresa, o material promocional do Vista Cyrela Furnished by (“decorado por”) Armani/Casa não economizou nos elementos de sabor colonialista, como um vídeo de apresentação narrado exclusivamente em inglês com tons e pausas dramáticas, exploração de conceitos vagos como “horizonte” e, claro, a incorporação da grife italiana no próprio nome do imóvel.
Ao lado do Jockey Club e previsto para 2028, o Vista terá duas torres, uma delas de 206 metros, só a perder em altura para o futuro edifício corporativo do complexo Alto das Nações, em construção não muito longe dali, do outro lado da marginal Pinheiros. O menor apartamento do Vista tem 350 m² –o valor do metro quadrado não foi informado.
O Vista se soma ao produto misto da Even que abrigará a futura terceira unidade mundial do hotel portenho Faena, em edificação a passos do shopping Eldorado, como ponta de lança de um novo momento do mercado imobiliário da cidade, fomentado pelas alterações da Lei de Zoneamento e voltado para quem efetivamente detém os meios de produção –ou de especulação.
Segundo a consultoria Bain & Company, o segmento imobiliário de luxo, definido por propriedades de valor acima de R$ 3 milhões, cresceu 339% em relação a 2020, a maior expansão percentual dos vários segmentos do setor entre 2020 e 2022. O dado só inclui as vendas primárias.
Mas o que movimenta com força o ecossistema, ainda que distante dos holofotes que iluminam os grandes lançamentos, é o chamado mercado secundário, de revenda ou mesmo de aluguel de imóveis de luxo e de altíssimo padrão. O Secovi-SP, sindicato patronal do setor no estado, não mensura o mercado secundário.
Um dos players desse mercado é a cinquentenária imobiliária Esquema, de atuação especialmente nos Jardins, e que negociou, por exemplo, a casa do empresário Joesley Batista no Jardim Europa. Em entrevista à Folha, Marco Túlio Vilela Lima, CEO e acionista da empresa, divide a parcela investidora de seu público entre a “turma que gosta de comprar, dar um tapa ou reformar o imóvel e colocá-lo para vender” e os “rentistas”, que ainda vêm bastante sentido em viver como locadores.
Para ele, “localização é um ativo”, e o fato de haver pouco espaço para novos lançamentos nos bairros muito desejados em que ele atua explica a dinâmica consolidada do mercado secundário.
Professor da Universidade Corporativa Secovi-SP e especializado no segmento de luxo, Ricardo Carazzai concorda com o protagonismo da localização no “real estate” e oferece um elemento novo à discussão, o ingresso de compradores do interior de São Paulo, do Centro-Oeste e ainda de outros países. “Essas pessoas querem habitar os bairros por onde circulam em São Paulo, e elas circulam em geral entre as avenidas Paulista e Faria Lima, quando muito pela Vila Nova Conceição”, diz.
O mercado secundário ganha espaço também nas redes sociais, graças ao trabalho de corretores influenciadores como Tamara Stief, da Mara Imóveis, e de empresas como a Refúgios Urbanos, que colocou em evidência nas mídias sociais diversas casas e apartamentos de autoria, mas não só.
Para o italiano Matteo Gavazzi, sócio-fundador da Refúgios, seus sócios e colaboradores são “apaixonados por arquitetura, o que significa ser apaixonados por bons projetos”.
“Há ótimos projetos sem assinatura em vilas e predinhos construídos por famílias sem a pitada de um arquiteto incrível por trás.”
Curiosamente, a Refúgios editou o caprichado “Prédios de São Paulo”, livro em três volumes que destaca edifícios saídos da prancheta do panteão da arquitetura “incrível” paulista. Há ali Franz Heep (do edifício Itália), Artacho Jurado (Bretagne), Vilanova Artigas (Louveira), Paulo Mendes da Rocha (Sesc 24 de Maio) e outros nomes bem mais contemporâneos como os dos profissionais do escritório FGMF (Edifício Corujas).
No site da Refúgios, um apartamento de 110 m² no icônico edifício Cinderela, outra pérola do badalado Artacho Jurado em Higienópolis (região central), é comercializado por R$ 2,15 milhões.
Matteo confirma que o segmento em que atua anda aquecido. “A moradia é uma necessidade que não cessará de existir, e muitos clientes querem sair da locação para se tornarem donos. Acredito que essa é e sempre será a força motora do mercado. Este ano ela talvez tenha sido maior.”