A Medida Provisória (MP) publicada em junho, que eleva a tributação das debêntures incentivadas, acendeu um sinal de alerta no setor de infraestrutura. A mudança fiscal deve impactar leilões futuros, mas afeta de forma mais crítica empresas que já venceram concessões com base em um custo de capital agora alterado.
Grupos como 4UM (Rota Agro Norte), EPR (seis concessões rodoviárias desde 2022), Aegea (contratos no Pará e Piauí), Rumo (ferrovias) e Motiva (ex-CCR) estão entre os principais prejudicados. A preocupação maior recai sobre empresas que firmaram empréstimos com liberação em tranches, como é o caso da Motiva, que fechou R$ 9 bilhões em debêntures com o BNDES. As novas parcelas poderão ser tributadas sob as novas regras, gerando desequilíbrios financeiros.
Tributação mais pesada
A MP estabeleceu que, a partir de 2026, os rendimentos de debêntures incentivadas passarão a ser tributados em 5% para pessoas físicas, que antes eram isentas. Já para pessoas jurídicas, a alíquota deve subir de 15% para até 25%, segundo interpretação majoritária. O impacto seria ainda maior porque os rendimentos passarão a compor o lucro tributável das empresas, elevando o custo de carregamento dos papéis pelos bancos.
De acordo com Marco Aurélio Barcelos, presidente da ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias), a medida pode aumentar em 2 pontos percentuais a taxa média das emissões no setor, elevando o spread atual de 7,3% para 9,3%.
Impacto nos contratos e reação do setor
Embora a diretora do BNDES, Luciana Costa, afirme que projetos já contratados serão preservados, empresas temem que a MP afete contratos em execução ou em fase de liberação de recursos. Para o setor de rodovias, já se discute até pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro junto ao poder concedente, uma disputa complexa do ponto de vista regulatório.
Fontes de mercado afirmam que algumas empresas tentam antecipar captações ainda em 2025, antes que as novas regras entrem em vigor. No entanto, isso não é viável para todos, e muitos contratos já previam emissões escalonadas para acompanhar o avanço das obras.
MP pode frear mercado de capitais e concentrar risco no BNDES
Especialistas alertam que a alteração pode desincentivar o mercado de capitais e recentralizar o financiamento no BNDES, o que vai na contramão da diversificação buscada nos últimos anos. “Não queremos voltar ao passado”, diz Costa, reforçando que o banco prefere coexistir com o mercado em projetos grandes.
A Motiva já declarou publicamente que, se a MP não for ajustada, haverá impacto direto na captação de recursos a custos competitivos. Já Rumo, 4UM, EPR e Aegea preferiram não comentar oficialmente.
Expectativa de mudanças no Congresso
A MP recebeu mais de 600 emendas e ainda está em debate no Congresso Nacional, o que pode abrir espaço para ajustes. Luiz Rosa, tributarista do Machado Meyer, afirma que a versão atual cria insegurança jurídica, ao alterar as regras no meio do jogo.
A expectativa é que o Legislativo promova modificações para proteger projetos já em andamento e evite um retrocesso no financiamento de infraestrutura, setor considerado essencial para o crescimento econômico de longo prazo.