Como a arquitetura ajuda na construção de hospitais temporários e estruturas emergenciais

A velocidade de disseminação do novo coronavírus exigiu que mundo afora fosse preciso montar uma operação de guerra para, além de segurar o avanço do contágio, dar conta de atender o número crescente de doentes da Covid-19.

Em praticamente todos os países atingidos pela pandemia o número de leitos disponíveis é insuficiente, o que fez com que os hospitais de campanha, comuns em cenários como campos de batalha ou regiões que sofreram com desastres naturais, se tornassem comuns na paisagem urbana. Tal fato, por sua vez, jogou luz sobre o papel, a importância da arquitetura na vida em sociedade, uma vez que ela é a disciplina capaz de construir, adaptar e reorganizar espaços de forma eficiente, que responda às necessidades de seus usuários, sejam elas urgentes ou latentes.

“Neste momento começamos a perceber o quanto um espaço bem projetado é uma construção para abrigar o homem, independentemente se ele é um espaço vazio ou edificado. Se se pega um parque, como o Central Park, por exemplo, falamos sobre uma arquitetura de lugar, posicionada entre prédios, mas que gera algumas facilidades [em tempos de pandemia] decorrentes de sua boa arquitetura. E o inverso também é verdadeiro”, aponta o arquiteto Gustavo Pinto, sócio da GP Arquitetura, escritório que tem diversos projetos de hospitais em seu portfólio.

O mesmo pensamento vale para estádios, pavilhões de eventos e outras estruturas que vem sendo adaptadas em tempo recorde para abrigar dezenas, centenas de leitos na tentativa de desafogar os sistemas de saúde. Tendo seus usos alterados à necessidade atual, eles se mostram não apenas capazes de receber tais estruturas pelo ponto de vista construtivo, como também costumam ter acessos facilitados e posicionamentos estratégicos dentro das cidades, fruto de projeto e planejamento urbano adequados, o que facilita a logística de movimentação de materiais, insumos e pessoas.

“Se você pensa em um campo de futebol, que tem três ou quatro entradas, por exemplo, isso permite que se crie todo um raciocínio de circulação no qual não haja cruzamentos internos [ou que eles sejam minimizados]. As pessoas podem entrar por um corredor para a triagem e sair por outro, ou pode-se criar salas de espera setorizadas por idades [ou grupos de risco], minimizando as chances de propagação de um vírus. Questões estas que são mais difíceis de serem adaptadas em um espaço já construído”, exemplifica o arquiteto.

Gustavo lembra ainda que, mesmo em se tratando de instalações temporárias, os hospitais de campanha têm as mesmas necessidades dos que funcionam em imóveis construídos para este fim no que se refere aos espaços necessários ao dia a dia da atividade, ou seja, na presença de áreas destinadas ao recebimento de medicamentos e insumos, ao depósito adequado do lixo hospitalar, ao descanso dos profissionais da saúde, ao necrotério, entre outros.

A rapidez da execução destes espaços, por sua vez, se deve ao avanço das tecnologias e sistemas construtivos, cada vez mais leves e fáceis de instalar, com estruturas em drywall, ferro e até tecido. Conheça sete hospitais de campanha construídos em resposta ao avanço do coronavírus pelo mundo.

Wuhan

Epicentro do contágio da pandemia, a China também foi o primeiro país a erguer hospitais de campanha para tratar os doentes da Covid-19. Em cerca de dez dias, 2,3 mil leitos e 55 mil m² de área foram erguidos do zero em Wuhan graças à opção por construções pré-fabricadas e ao trabalho ininterrupto, dia e noite, de mais de 1 mil operários. Com operações iniciadas no início de fevereiro, as instalações foram desativadas no último dia 10 de março pelo governo chinês, após a contenção do surto na cidade.

Milão

Entre as cenas mais impactantes que o coronavírus tem causado dentro do universo do design está a da transformação de dois dos pavilhões do centro de eventos Fiera Milano, tradicionalmente reconhecido por abrigar o Salão do Móvel de Milão, mais importante evento de design do globo, em um hospital de campanha. Entregue no dia 1º de abril, após dez dias de obras, o espaço tem mais de 200 leitos disponíveis e cerca de 500 profissionais atuando no atendimento dos pacientes.

Pacaembu, Anhembi e Ibirapuer

Desde o último dia 6 de abril, o Estádio do Pacaembu, na capital paulista, recebe doentes de baixa e média complexidade infectados pelo coronavírus. O gramado deu lugar a duas tendas, que somam uma área de 6,3 mil m² e tem capacidade para 200 leitos – oito deles de UTI (Unidade de Terapia Intensiva). Há 30 banheiros completos (com chuveiro) e refeitório com capacidade para 350 refeições diárias, além de sala de acolhimento para familiares, área reservada ao repasse de informações sobre pacientes e salas individuais para conversas.

No último sábado (11), foi a vez do Hospital Municipal de Campanha do Anhembi dar entrada em seu primeiro paciente, fato decorrente da conclusão da primeira etapa das obras de implantação da estrutura hospitalar. Nela, 326 leitos para pacientes de baixa complexidade estão em funcionamento. A previsão, no entanto, é a de que o hospital ofereça 1,8 mil leitos, em cerca de 80 mil m² de área, quando as demais fases de implantação forem concluídas, com início das operações previsto para a segunda quinzena de abril.

Já para 1º de maio está prevista a abertura do hospital de campanha do Ibirapuera, que ocupará o gramado e parte da pista de atletismo do Complexo Desportivo Constâncio Vaz Guimarães, localizado em dos cartões-postais da cidade. Serão 7,5 mil m² ocupados por 240 leitos de baixa complexidade, 28 leitos de estabilização, consultórios médicos, equipamentos de tomografia e sala de descompressão.

Manaus

O elevado número de casos do novo coronavírus na capital do Amazonas fez com que a prefeitura de Manaus inaugurasse no último domingo (12) o Hospital de Campanha Municipal Gilberto Novaes, instalado nas dependências do Centro Integrado Municipal de Educação (Cime) do Lago Azul. Inicialmente com 18 leitos de UTI, a unidade deverá receber outros 19 nesta quarta-feira (15) e somar 150 leitos quando a adaptação das estruturas for finalizada.

Buenos Aires

Na Argentina, a construção dos hospitais de campanha está entre as ações adotadas pelo governo para fortalecer o sistema de saúde. O país está em quarentena até o próximo dia 26 de abril. Um deles foi instalado no Campo de Mayo, a 30 km da capital Buenos Aires, conhecido por abrigar centros de detenção e tortura durante a ditadura argentina. Em frente ao prédio do hospital militar foram instalados contêineres e tendas brancas que recebem os testados positivos para a Covid-19. A instalação dispõe de centro de esterilização, energia própria, estação de purificação de água, 28 leitos e laboratório.

Fonte: gazetadopovo.com.br