Aplicações da nanotecnologia na construção civil

Não é surpresa que o uso da tecnologia é um dos caminhos para a transformação. Por meio dela, há como expandir possibilidades e superar limites antes inalcançáveis. Nesse contexto, aplicações da nanotecnologia na construção civil despontam como uma maneira de revolucionar o setor.

A fim de tratar esse tema com a perícia adequada, entrevistamos Tarcizo Cruz, engenheiro civil, doutorando em Engenharia Química e pesquisador do Centro de Tecnologia em Nanomateriais e Grafeno ( CTNano)/UFMG — que é focado no desenvolvimento de produtos, processos e serviços a partir das classes de materiais que têm estrutura nanométrica.

Ao longo do texto, explicaremos no que consiste a nanotecnologia e quais são as principais formas de aplicá-la. Acompanhe até o fim para não perder nenhuma informação!

O que é a nanotecnologia e como ela começou?

De acordo com o especialista, a nanotecnologia pode ser entendida como uma técnica que permite manipular, processar e fabricar dispositivos, sistemas complexos e materiais na escala nanométrica. Na prática, esses elementos estão na escala do bilionésimo do metro, ou seja, um bilhão de vezes menor que um metro — que é o tamanho de um nanômetro.

Ela passou a ser mais utilizada e testada em laboratórios no início dos anos 90. O desenvolvimento nesse período se deu em função do advento dos microscópios eletrônicos e de técnicas que permitiram a visualização desses materiais. Antes disso, até era possível sintetizar um ou outro material — inclusive, algumas espadas forjadas no fogo continham nanocristais, segundo Tarcizo. Contudo, ninguém tinha essa compreensão, visto que não havia métodos para identificar a presença de materiais na nanoescala.

Atualmente, a Ciência tem dado passos significativos no sentido de implementar nanomateriais e soluções. Os usos estão ocorrendo em variados campos, como medicina, biologia, materiais compostos e eletrônica, voltando-se para o desempenho de materiais como um todo.

A indústria de cosméticos, por exemplo, já usa produtos nanométricos em suas fabricações. Contudo, ainda existem obstáculos a serem superados para o sucesso de aplicações em larga escala — como custos e processos.

Quais são as aplicações da nanotecnologia na construção civil?

Segundo Tarcizo Cruz, o uso dessa tecnologia na construção civil é incipiente. Existem aplicações que apresentaram bons resultados no setor, porém, são bem pontuais. Um exemplo de sucesso é o Santuário da Divina Misericórdia — em Roma, capital da Itália —, que conta com um nanomaterial utilizado para desenvolver um revestimento autolimpante.

Como a poluição atmosférica se deposita de maneira gradativa sob a estrutura do santuário, foi adotada uma argamassa com nanopartículas de dióxido de titânio (TiO2 ), capazes de degradar a matéria orgânica e eliminar a sujeira, mantendo a cor branca da construção — fundamental em seu projeto arquitetônico.

O pesquisador conta que, no centro de tecnologia onde atua, é feito um trabalho com o desenvolvimento do cimento com nanotubo de carbono. De acordo com ele, consta na literatura científica da área a aplicação de nanotubos em matrizes cimentícias, concretos e argamassas, com objetivo de promover melhorias no desempenho mecânico e durabilidade.

Cabe ressaltar que esse produto foi desenvolvido em 2010, patenteado no Brasil, nos Estados Unidos e na China. Isto é, a tecnologia já foi criada, elaborada e validada — a partir disso, é necessário fazer a implementação na fábrica e promover a comercialização do material. Apesar das conquistas recentes, as aplicações no setor não atingiram, por enquanto, todo o potencial possível.

Na Europa, há um planejamento governamental, em parceria com empresas do ramo, responsável por levantamentos e estudos a respeito dos impactos da nanotecnologia na construção civil até o ano de 2030, o NANOCONEX.

A partir desses estudos, a comunidade europeia estabelece algumas recomendações para aplicação dos nanomateriais, principalmente na questão de saúde e exposição dos trabalhadores. No Brasil, entretanto, isso está começando a ser discutido agora e de maneira não muito formal por parte dos órgãos regulamentadores.

Quais são os possíveis impactos da nanotecnologia na construção civil?

Imagine um prédio cuja arquitetura optou por uma fachada com revestimento de chapas de aço. É necessário que essas chapas não oxidem de forma alguma, certo? Nesse caso, filmes finos com nanopartículas podem ser depositados nesse aço, funcionando como uma barreira de proteção para que a chapa não sofra com oxidação.

Além disso, de acordo com o engenheiro, incorporar nanomateriais de carbono — como grafeno e nanotubos de carbono — a uma matriz de concreto, a estrutura torna-se menos suscetível a agentes deletérios, de carbonatação e oxidação. Isso acontece porque há um reforço na escala microestrutural, garantindo maior resistência, durabilidade e, portanto, um melhor desempenho.

Assim, com o aumento de vida útil das estruturas, construções que foram inicialmente projetadas para durar cinquenta anos, que poderão superar a marca de setenta, oitenta ou mesmo cem anos, estima Tarcizo.

Em uma perspectiva global, haverá uma redução do consumo dos recursos naturais, o que é ótimo em termos de sustentabilidade. Em vez de construir dois edifícios para durar meio século cada um, é viável criar uma única estrutura, que vai durar mais e consumir menos.

Materiais

É oportuno destacar que as possibilidades de uso não se restringem aos nanomateriais de carbono. Também há como trabalhar com nanopartículas de dióxido de titânio, que podem servir para gerar filmes fotocatalíticos, úteis para superfícies de sacrifício aplicadas em chapas de aço ou de fibra de aço, com filmes de nanopartículas de dióxido de silício.

Outras opções são os materiais cerâmicos de alumínio, sílica e titânio, que podem ser utilizados especificamente no caso de metais, para proteções anticorrosivas ou até filmes que possam ser usados como superfícies hidrofóbicas, super-hidrofóbicas e assim por diante.

Perspectivas futuras

De acordo com Tarcizo Cruz, estamos vivendo um momento de mudança de paradigmas: temos que ir além das funções estruturais e sociais das construções e começar a pensar nas possibilidades das smart structures. É o momento de procurar soluções diferenciadas como um prédio que retenha calor e gere energia — e esse tipo de avanço pode ser alcançado a partir da nanotecnologia.

Enfim, é inegável que há muito a ser explorado no contexto da nanotecnologia na construção civil. De qualquer forma, os impactos positivos que ela pode trazer para o setor devem ser acompanhados de perto, porque representam um imenso potencial.