Automação no canteiro de obras
Há anos, o setor da construção civil vem enfrentando uma escassez de mão de obra especializada, algo que tem impulsionado o desenvolvimento de novas tecnologias e sistemas automatizados de construção. A recente crise sanitária apenas exacerbou essa tendência, fazendo com que muitas empresas de automação—que antes se dedicavam principalmente à fabricação de automóveis—voltassem sua atenção à indústria da construção civil. Neste contexto, espera-se que a automatização dos meios de produção na engenharia e na arquitetura cresça até um 30% ao longo dos próximos anos.
Diante da atual carência de mão de obra qualificada, da crescente expansão da indústria da construção civil e da necessidade de minimizarmos o impacto ambiental de nossos meios e processos de construção, a automação tem se firmado como uma das principais estratégias da indústria para aumentar a produtividade e eficiência ao mesmo tempo que permite reduzir custos e minimizar o desperdício. “A automação na indústria da construção civil está defasada em 50 anos em comparação ao setor automotivo. Embora a integração de processos automatizados na indústria da construção seja um processo ainda incipiente, grandes mudanças ainda estão por vir,” disse Sami Atiya, presidente de Robótica e Automação da ABB. Uma pesquisa realizada no ano de 2019 pelo McKinsey Global Institute, ainda antes do início da pandemia, aponta para o fato de que 44% dos processos de construção no mundo hoje tem um enorme potencial de automatização. Ainda assim, os expertos não acreditam que no futuro teremos canteiros de obras 100% automatizados—seres humanos ainda serão fundamentais para cumprir certas tarefas essenciais.
Os caminhos possíveis
No momento, a automação está sendo desenvolvida e integrada aos nossos tradicionais processos de construção de duas diferentes formas: na substituição da mão de obra humana por máquinas e no desenvolvimento de novos processos, materiais e tecnologias de construção. A alguns anos, o assentador de tijolos SAM surgia para revolucionar o trabalho no canteiro de obras, um robô capaz de assentar tijolos três vezes mais rápido que um trabalhador humano. Nesta mesma linha, o robô Hadrian X, desenvolvido pela empresa australiana Fastbrick Robotics, foi utilizado e testado em diversos projetos-piloto construídos no México e na Austrália e está prestes a ser fabricado e lançado no mercado. A automatização dos tradicionais processos de construção também tem sido explorada por uma equipe de pesquisadores da Universidade Chinesa de Hong Kong (CUHK), os quais desenvolveram um robô para construir fachadas de estruturas em altura, um grande avanço em relação a segurança no canteiro de obras.
Neste contexto é importante atentarmos ao fato de que os processos e os materiais de construção tradicionais limitam as possibilidades e potencialidades da integração de novas tecnologias na indústria da arquitetura e construção. Ainda assim, a automatização dos processos de construção, seja através da substituição da mão de obra humana seja na incorporação de novas tecnologias e sistemas de construção, tem um potencial significativo para transformar a maneira como concebemos e construímos nossos edifícios, como bem ilustrado em muitos projetos experimentais desenvolvidos ao longo dos anos pelo Institute for Computational Design (ICD) e pelo Institute of Building Structures e Projeto Estrutural (ITKE), como o Pavilhão de Fibra e o Pavilhão Elytra Filament.
Pioneiros
A automação dos processos de construção já é uma realidade, como nos mostra a parceria firmada recentemente entre a Foster + Partners e a empresa de design de robôs Boston Dynamic. Como uma das principais empresas pioneiras no ramo, a Boston Dynamic desenvolveu um robô chamado de “Spot”, o qual está sendo colocado à prova em uma extensa fase de testes em diferentes canteiros de obras. Os primeiros resultados são impressionantes, e o Spot tem se mostrado incomparável em relação a processos mais tradicionais de construção. O robô da Boston Dynamic também pode ser utilizado em processos de controle de qualidade, comparando dados de projeto e de execução in loco com rapidez e eficiência. O interesse e o engajamento da Foster + Partners na incorporação de processos de automação em seus canteiros de obras proporcionou um salto de qualidade no desenvolvimento destas novas tecnologias, e isso significa que estamos caminhando a passos largos em direção a um canteiro de obras cada vez mais automatizado, pelo menos na industria da arquitetura de ponta. “A utilização de robôs em um canteiro de obras parecerá tão comum no futuro quanto o é a chegada de uma escavadeira ou empilhadeira nos dias de hoje”. O robô da Boston Dynamic foi utilizado e testado para executar diversas tarefas por várias construtoras ao redor do mundo.
Em 2018, Dubai anunciou que até o ano de 2025, 25% de todos os novos edifícios seriam construídos através de processos 100% automatizados. Este prazo, excessivamente otimista, foi recentemente atualizado para 2030. Acontece que, naquela época, Dubai já tinha construído seu primeiro edifício de escritórios com tecnologias de impressão 3D. Chamado de Escritório do Futuro e projetado em parceira pela Killa Design e pela Gensler, este edifício foi um dos pioneiros nesta linha, e posteriormente, em 2019, Dubai inaugurava o maior edifício impresso em 3D do mundo todo, o qual foi construído com a colaboração de apenas três pessoas no local. Ainda assim, ninguém pode afirmar com certeza que o ambicioso plano da cidade para 2030 será realmente concretizando; no entanto, as autoridades locais estão trabalhando para isso e Dubai será a primeira cidade do mundo a contar com um código de obras específico a regulamentar construções 100% automatizadas.
Apesar de todo o ceticismo com que muitos arquitetos e arquitetas encaram a integração de processos automatizados na industria da construção civil, parece haver um claro consenso de que isso nos permitiria construir com mais precisão e exatidão, reduzindo custos e minimizando o desperdício. Além disso, a complexidade geométrica não será mais uma limitação e tampouco acarretará em um aumento considerável nos custos de produção, impulsionando finalmente a criatividade dos projetistas. Somando-se a isso, a automação nos permitirá desenvolver novas soluções e formas, provocando uma possível e profunda transformação em nossos processos de projeto e construção.