Mudança na arquitetura europeia
Philip Capel, de 55 anos, lembra do dia em que saiu de uma conferência na École Militaire, centro de inteligência do Exército da França, e caminhou pelo parque de Champs de Mars até a Torre Eiffel, há cinco anos. Encontrou um espaço aberto, em que pessoas chegavam e partiam em liberdade. Na semana passada, o mesmo caminho foi bloqueado por uma série de tapumes de obras e por um muro de vidros à prova de balasque agora cercam um dos monumentos mais visitados do mundo.
“É horrível que tenhamos de proteger monumentos como esse de pessoas loucas dispostas a tudo”, lamenta o holandês que vive em Bruxelas. “Creio que um muro como esse talvez lhes dê uma sensação de segurança e funcione contra caminhões, mas não creio vá de fato proteger as pessoas de atentados.”
Em razão da ameaça terrorista, ainda considerada elevada, Paris e várias capitais da Europa estão revendo seu urbanismo e erguendo barreiras à circulação para tentar ampliar a segurança e demover terroristas de se lançar em novos atentados.
Desde que os irmãos Kouachi atacaram a redação do jornal satírico Charlie Hebdo, em 7 de janeiro de 2015, e em especial após os ataques de 13 de novembro de 2015, em Paris, e de 14 de julho de 2016, em Nice, uma série de obras e medidas de proteção foram empregadas na capital francesa para limitar o risco de ataques com carros-bomba ou atropelamentos em massa. O resultado é uma espécie de “urbanismo antiterrorismo”, cada vez mais visível não apenas na França.
No dia a dia, Paris – a cidade mais atingida por atentados – está cheia de exemplos de como o trauma do terrorismo agora deixa sequelas no urbanismo. Em vários pontos do centro, barreiras ainda improvisadas de concreto impedem o ingresso de veículos em ruas de pedestres, parques e praças, no cais do Sena ou nas imediações de centros comerciais.
O objetivo é, sobretudo, evitar que um novo atentado com caminhão ou veículo de grande porte, como o realizado em Nice em nome do Estado Islâmico, que deixou 86 mortos e 458 feridos – vários em estado grave – possa se repetir.
Outro ponto bloqueado depois da série de atentados é a Rua do Faubourg Saint-Honoré, onde se concentram dezenas de lojas dentre as mais luxuosas do mundo.
Um trecho em frente ao Palácio do Eliseu, a sede do poder e a residência oficial dos presidentes da república, foi interditado ao trânsito com barreiras para evitar o tráfego de veículos. Carros de polícia reforçam a vigilância, estacionados no meio da rua. No mesmo local, automóveis e pedestres costumavam passar sem serem notados ou interpelados por policiais há pouco mais de um ano. A situação mudou de forma drástica.
Torre Eiffel
Mas o exemplo mais simbólico do “urbanismo antiterrorismo” em Paris é o entorno da Torre Eiffel, onde as obras para a construção das 450 lâminas de vidros à prova de balas com 6,5 centímetros de espessura e das grades nas laterais do monumento avançaram a ponto de as barreiras já serem visíveis.
“Antes andávamos livremente, mas desde que todos esses loucos apareceram e estão à solta, tornou-se necessário”, disse Mickael S., de 75 anos, que fotografou o monumento em uma visita na semana passada. Ainda que seja desagradável, a proteção não o surpreendeu, porque os exemplos se espalham pela França, até mesmo por estradas, onde áreas de repouso dos motoristas agora estão sendo fechadas. “O muro em torno da torre não é bom, mas é necessário”, disse o aposentado.
Para muitos especialistas, imaginar que muros, vidros à prova de balas, grades ou barreiras possam impedir novos atentados é uma utopia – até porque os visitantes agora ficam do lado de fora da área da torre, esperando para comprar ingresso ou passar pelo controle de segurança, o que leva a uma aglomeração de pessoas.
Membros de associações como “Os Amigos do Champ de Mars” também criticam o “urbanismo do terrorismo”, que segundo Jean-Sébastien Baschet, presidente da associação, não garante a segurança. “Estamos consternados de ver o público maltratado e os turistas partirem escandalizados”, diz. “Fizeram um projeto que não vai em absoluto no sentido de uma maior segurança e de um melhor acolhimento do público.”
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Muro de vidro
Uma das principais razões de protestos é que as medidas vêm sendo tomadas sem acordo com a sociedade civil. A construção do muro de vidro em torno da torre, por exemplo, foi deliberada entre a polícia, a prefeitur e a Sociedade Exploradora da Torre Eiffel (Sete), sem que o projeto fosse submetido a um concurso público de arquitetura. “Trata-se de uma questão de democracia e de respeito do interesse geral”, protestou a associação.
Às críticas sobre a estética da barreira, a prefeitura responde com o argumento de que encomendou as novas grades laterais ao designer e arquiteto austríaco Dietmar Feichtinger, que procurou valorizar o desenho do monumento e sua história, imaginando barras de metal em formas que remetem à torre e com 3,24 metros de altura – exatamente um centésimo da torre.
Só no entorno da Torre Eiffel, os trabalhos custaram € 35 milhões à empresa que explora o turismo no monumento. Segundo a entidade, entre 6 e 7 milhões de turistas devem passar pela “Dama de Ferro” em 2018 – número que não tende a variar em razão da obra.