O preço do gás natural destinado à indústria brasileira tem sido um dos mais altos do mundo, chegando a US$ 20 por milhão de BTUs (cerca de R$ 112). Esse valor é dez vezes superior ao praticado nos Estados Unidos e o dobro do cobrado na Europa, segundo estudo divulgado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). O documento de 86 páginas analisa o mercado do insumo energético no país e destaca os desafios enfrentados cinco anos após a aprovação da Nova Lei do Gás.
Impacto no Setor Industrial
O gás natural é essencial para a indústria brasileira, utilizado tanto como fonte de energia quanto como matéria-prima para produtos como fertilizantes. No entanto, o consumo industrial, que representa 60% do total, está estagnado há mais de uma década, conforme aponta a CNI. A alta do preço do combustível impacta diretamente a competitividade das empresas nacionais, dificultando investimentos e modernização.
A análise revela que US$ 9 do preço atual estão relacionados ao escoamento e processamento – custos que poderiam ser reduzidos para cerca de US$ 2, segundo estudo da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao Ministério de Minas e Energia (MME).
Desafios do Mercado de Gás
A CNI lista diversos obstáculos que ainda persistem no setor:
- Regulamentação pendente: Dos 15 temas regulatórios previstos, apenas três foram concluídos pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). A falta de recursos humanos é apontada como principal fator para os atrasos.
- Concentração na comercialização: A Petrobras ainda detém grande parte do controle sobre o escoamento e a comercialização do gás, dificultando a entrada de novos players no mercado.
- Baixa transparência: Informações sobre capacidade disponível e condições contratuais de infraestruturas de escoamento e processamento são limitadas, prejudicando a atuação de novos entrantes.
- Falta de compromisso federal: O estudo enfatiza a necessidade de uma atuação coordenada entre governo, reguladores e setor privado para garantir segurança jurídica e atrair investimentos.
Competitividade e Transição Energética
Para Rennaly Sousa, especialista em energia da CNI, o gás natural está diretamente ligado à competitividade industrial, à transição energética e às metas de descarbonização. “O gás tem potencial para substituir fontes mais poluentes, como carvão, óleo combustível e lenha, contribuindo para a agenda climática global”, afirma. Ela ressalta que ainda há grandes entraves para o desenvolvimento do mercado e defende a continuidade do processo de reestruturação do setor.
Rennaly também menciona iniciativas recentes do governo, como o Novo Decreto da Lei do Gás (Decreto nº 12.153/2024) e a criação do Comitê de Monitoramento do Gás Natural, voltadas para maior transparência e abertura do mercado. No entanto, ela reitera a necessidade de recursos para que a ANP cumpra sua agenda regulatória.
Recomendações da CNI
O estudo traz seis recomendações prioritárias:
- Implementar integralmente a Nova Lei do Gás;
- Regulamentar o mercado organizado de gás;
- Garantir transparência no acesso às infraestruturas essenciais;
- Regulamentar aspectos do transportador independente;
- Prevenir práticas anticompetitivas e estimular a competitividade;
- Estabelecer um compromisso federal com a abertura do mercado.
Posição do Governo
O Ministério de Minas e Energia (MME) reconhece os avanços legais no setor de gás natural nos últimos anos, mas admite que ainda há desafios a serem superados. A pasta informou que apresentará propostas específicas para todos os elos da cadeia, incluindo produção nacional, importação de gás da Argentina e Bolívia, e melhorias nas infraestruturas de escoamento, processamento e transporte por dutos.
“Essas ações fortalecerão a neoindustrialização da economia brasileira, aumentando a competitividade da indústria e gerando empregos e renda, com compromisso na descarbonização da matriz energética nacional”, destacou o MME.